Os proventos de
aposentadoria investidos em aplicação financeira por cônjuge casado em regime
de comunhão universal de bens integram o patrimônio comum do casal, porque
deixam de ter caráter alimentar. Por esse motivo, o valor aplicado, inclusive
os rendimentos, deve ser partilhado no momento em que sociedade conjugal for
extinta.
Com esse
entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou
provimento a recurso especial de uma servidora pública aposentada. A Turma
considerou que os proventos de aposentadoria somente são considerados bem
particular, excluído da comunhão, enquanto mantiverem caráter alimentar em
relação ao cônjuge que os recebe.
Após a morte do
ex-marido da servidora (na ocasião, eles já estavam separados), foi aberto inventário
para partilha dos bens adquiridos à época do matrimônio, já que se casaram em
regime de comunhão universal. Entre esses bens, foram incluídos proventos de
aposentadoria da mulher, aplicados como reserva patrimonial durante a vigência
do casamento.
ECONOMIA DO CASAL
Para o Tribunal
de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), os valores recebidos por qualquer dos
cônjuges até a separação de fato do casal comunicam-se, sendo irrelevante a
origem, pois constituíam economia do casal, porém os valores recebidos depois
da separação fática não se comunicam, pois a separação põe fim ao regime de
bens.
No recurso
especial direcionado ao STJ, a aposentada sustentou que os proventos de
aposentadoria recebidos constituem patrimônio exclusivo e não se comunicam
durante a vigência da sociedade conjugal.
Alegou que a
decisão do TJRS ofendeu os artigos 1.659, inciso IV, e 1.668, inciso V, ambos
do Código Civil (CC). De acordo com esses dispositivos, ficam excluídos da
comunhão: as obrigações provenientes de atos ilícitos; os bens de uso pessoal;
os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge; as pensões e outras rendas
semelhantes.
CASO SIMILAR
Ao analisar o caso, o ministro Marco Buzzi, relator do recurso especial, mencionou uma situação similar, amparada em jurisprudência pacificada no STJ. Segundo o ministro, as verbas recebidas a título de indenização trabalhista, mesmo após a dissolução do casamento, devem ser partilhadas entre o casal.
O relator
explicou que o STJ adota o entendimento de que “a diminuição salarial
experimentada por um dos cônjuges repercute na esfera patrimonial do outro, que
passa a dispor de modo mais intenso de seus vencimentos para fazer frente às
despesas correntes do lar”.
Portanto, já que não existem precedentes referentes à hipótese idêntica à analisada, ele entendeu que deveria seguir a mesma linha de raciocínio adotada nos casos de indenização trabalhista.
DEVER LEGAL
“Estabelecida a sociedade conjugal, ambos os consortes passam imediatamente a obedecer ao dever legal de mútua assistência (artigo 1.566, III, do CC), sendo ainda responsáveis pelos encargos da família (artigo 1.565, caput, do CC) e, por decorrência, obrigados a concorrer, na proporção de seus bens e dos rendimentos do trabalho, para o sustento da família e educação dos filhos, qualquer que seja o regime patrimonial (artigo 1.568 do CC)”, afirmou Buzzi.
Segundo o relator, a interpretação literal dos artigos 1.668, inciso V, e 1.659, incisos VI e VII, conduz ao entendimento de que os valores obtidos pelo trabalho individual de cada cônjuge seriam incomunicáveis, impedindo a comunhão até mesmo dos bens adquiridos com tais vencimentos.
“No entanto, sempre asseverando a manifesta contradição de tal exegese com o sistema, é corrente na doutrina brasileira que referidas disposições atinentes à incomunicabilidade dos vencimentos, salários e outras verbas reclamam interpretação em sintonia e de forma sistemática com os deveres instituídos por força do regime geral do casamento”, argumentou.
SOBRAS
Para Buzzi, não é possível considerar imunes as verbas obtidas pelo trabalho pessoal de cada cônjuge, ou proventos e pensões, nem mesmo aptos a formar uma reserva particular, pois o casamento institui obrigação de mútua assistência e de manutenção do lar por ambos os cônjuges.
Ele explicou que os salários, proventos e outras verbas periódicas são impenhoráveis, conforme o Código de Processo Civil, e incomunicáveis, como estabelece o CC, devido à necessidade de manter a garantia alimentar ao titular desses valores. Entretanto, no caso da incomunicabilidade, explicou que a proteção deve ser compatível com os deveres recíprocos de sustento e auxílio mútuo entre os cônjuges.
“Nesse sentido, quando ultrapassado o lapso de tempo correspondente ao período em que são periodicamente percebidas as verbas, havendo sobras, esse excesso deixa de possuir natureza alimentar”, afirrmou.
Diante disso, a Quarta Turma manteve a decisão do TJRS, entendendo ser lícita a inclusão das verbas referidas entre os bens a serem partilhados no inventário.
REsp 1053473
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