quarta-feira, 24 de outubro de 2012

RENÚNCIA À HERANÇA SÓ PODE SER FEITA POR PROCURADOR CONSTITUÍDO POR INSTRUMENTO PÚBLICO


Por maioria de votos, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, quando a renúncia à herança é feita por procurador, este não pode ser constituído mediante instrumento particular. A outorga da procuração precisa ser feita por instrumento público ou termo judicial. 

Acompanhando o voto-vista do ministro Sidnei Beneti, a Turma entendeu que, se o artigo 1.806 do Código Civil (CC) estabelece que a renúncia deve constar expressamente de instrumento público ou termo judicial, então a concessão de poderes para essa renúncia também tem de ser realizada por meio dos mesmos instrumentos. 

A questão discutida pelos ministros não foi em relação à possibilidade ou não da renúncia por procurador, a qual é inteiramente válida quando a procuração dá poderes específicos para a renúncia. A Turma discutiu a forma de constituição do procurador para a renúncia, ou seja, a necessidade de instrumento público para a transmissão de poderes. 

CAUTELA 

Beneti ressaltou que a exigência de instrumento público, constante no artigo 1.806 do CC, é decorrente do disposto no artigo 108 do mesmo código, que considera a escritura pública essencial à validade dos negócios jurídicos que visem “à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis”. 

Segundo o ministro, “a exigência da lei tem toda razão de ser, pois, caso contrário, seria aberto caminho fácil à atividade fraudulenta por intermédio de escritos particulares”. Assim, ele concluiu que o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) violou o artigo 1.806 do CC, ao validar renúncia à herança feita por procurador constituído por instrumento particular. 

Por isso, seguindo o voto de Beneti, a maioria dos ministros da Turma deu provimento ao recurso, restabelecendo a sentença de primeiro grau. Ficou vencido o relator, ministro Massami Uyeda, que negava provimento ao recurso e mantinha a decisão do TJSP. 

REsp 1236671

terça-feira, 23 de outubro de 2012

ERRO NA APLICAÇÃO DE LEI NÃO AUTORIZA DESCONTO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO SERVIDOR


É incabível o desconto das diferenças (a mais) recebidas indevidamente pelo servidor, em decorrência de errônea interpretação ou má aplicação da lei pela administração pública, quando constatada a boa-fé do beneficiado.
A decisão é da 1ª Seção do STJ, no julgamento de um recurso sob o rito dos repetitivos. O recurso especial paradigmático é de autoria da Universidade Federal da Paraíba, contra um servidor da instituição. A universidade alega que, independentemente de ter ocorrido ou não boa-fé, o servidor deve repor ao erário os valores recebidos de forma indevida.
Informou ainda que, diante da constatação do pagamento indevido de Vantagem Pecuniária Individual (VPI) no valor de R$ 59,87, apontado pela Controladoria-Geral da União, foi comunicada ao servidor a exclusão da mencionada vantagem de sua folha de pagamento, bem como que os valores pagos indevidamente deveriam ser repostos ao erário.
Em seu voto, o relator, ministro Benedito Gonçalves, destacou que o artigo 46 da Lei nº 8.112/90 prevê a possibilidade de reposição ao erário de pagamento feito indevidamente, após a prévia comunicação ao servidor público ativo, aposentado ou pensionista.
Entretanto essa regra tem sido interpretada pela jurisprudência do STJ com alguns temperamentos, principalmente em decorrência de princípios gerais do direito, como a boa-fé, que acaba por impedir que valores pagos de forma indevida sejam devolvidos ao erário - disse o relator.
O ministro ressaltou ainda que o caso se restringe à possibilidade de devolução ao erário de valores recebidos indevidamente por errônea interpretação da lei por parte da administração pública.
O julgamento se deu pelo rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil. O entendimento fixado pelo STJ vai orientar a solução de todos os demais processos sobre o mesmo tema, que tiveram o andamento suspenso nos tribunais de segunda instância desde o destaque do recurso para julgamento na Seção. (REsp nº 1244182 - com informações do STJ).

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

NOVO CÓDIGO FLORESTAL REDUZ VANTAGENS DE MÉDIOS E GRANDES AGRICULTORES


O Senado divulgou um resumo de como ficou o novo Código Florestal após sanção da lei 12.727/12. O texto foi aprovado por Dilma Rousseff com nove vetos, dentre eles o que tratava sobre a recuperação de áreas de mata nas margens dos rios.

De acordo com o órgão, os vetos reduzem as vantagens de médios e grandes agricultores, mas facilitam a regularização dos que desmataram ilegalmente áreas de proteção permanente. Assim, multas por desmatamentos ilegais poderão ser convertidas em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
RECOMPOSIÇÃO DE APP
Estão mantidas no novo Código Florestal as faixas mínimas de recomposição de APP - Áreas de Proteção Permanente para pequenas propriedades, para qualquer tamanho de rio: propriedades até um módulo fiscal deverão recompor faixa de mata de 5 metros de largura; de 1 a 2 módulos fiscais, faixa de 8 metros de largura; e de 2 a 4 módulos fiscais, 15 metros de mata ao longo dos rios.
No entanto, foi vetado pela presidência inciso que tratava de propriedades maiores que 4 módulos fiscais e incluiu no decreto 7.830/12 regra para regularização de APPs nessas unidades. O decreto prevê a recomposição de pelo menos 20 metros de mata, em rios de até dez metros, para propriedades de 4 a 10 módulos fiscais. A bancada ruralista queria reduzir a exigência para 15 metros de mata e ampliar para até 15 módulos fiscais as unidades beneficiadas.
Ainda conforme o decreto, para as demais situações, será obrigatória a recomposição de mata em faixa correspondente à metade da largura do rio, observado o mínimo de 30 metros e o máximo de 100 metros. No projeto aprovado no Congresso, o limite mínimo havia sido reduzido para 20 metros. A presidente também vetou a possibilidade de recomposição de apenas 5 metros de mata ciliar para rios intermitentes com até dois metros de largura, independentemente da área do imóvel rural.
A área máxima obrigatória de recomposição de APP não pode ultrapassar 10% das propriedades com até 2 módulos fiscais e 20% das unidades de 2 a 4 módulos fiscais. Foi vetada regra prevendo que a exigência de recomposição de APP não poderia ultrapassar 25% das propriedades entre 4 e 10 módulos fiscais.
CÔMPUTO DE APP NO CÁLCULO DA RESERVA LEGAL
A presidente da República manteve norma incluída no Congresso permitindo o cômputo de APP no cálculo da reserva legal, mesmo que implique novos desmatamentos, quando a soma de APP e vegetação nativa for maior que 80% do imóvel em áreas de floresta da Amazônia Legal.
No entanto, vetou essa possibilidade para as demais regiões do país. Os parlamentares propunham, para propriedades fora da área de floresta na Amazônia Legal, que o cômputo com novos desmatamentos fosse permitido quando a soma de APP e vegetação nativa fosse maior que 50% da área dos imóveis.
FRUTÍFERAS EM APP
O Executivo também decidiu excluir a possibilidade de plantio de frutíferas na recomposição de APPs. Para regularização dessas áreas será permitida a regeneração natural ou o plantio de espécies nativas. Para pequenas propriedades, será admitido o plantio intercalado de espécies lenhosas, perenes e de ciclo longo, exóticas com nativas, até 50% da área total a ser recomposta.
VÁRZEA
Foi vetado parágrafo que determinava não ser de preservação permanente a várzea existente além dos limites da mata ciliar obrigatória (faixas de APP ao longo dos rios).
REGULARIZAÇÃO AMBIENTAL
O decreto 7.830/12 prevê que sejam instituídos nos estados e no Distrito Federal os PRAs - Programas de Regularização Ambiental, nos quais estarão estabelecidas as ações a serem desenvolvidas pelos proprietários que queiram legalizar áreas hoje irregulares quanto às normas ambientais.
Os programas deverão ser implantados em até dois anos da data da publicação do novo Código Florestal. Nesse período até a implantação do PRA e após a adesão do agricultor ao programa, o proprietário rural não poderá ser autuado por desmatamentos ilegais ocorridos antes julho de 2008.
E quando o agricultor assinar termo de compromisso previsto no PRA, estarão suspensas as multas por desmatamentos ilegais, que serão consideradas como convertidas em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
O decreto também cria o SICAR - Sistema de Cadastro Ambiental Rural, responsável por receber, gerenciar e integrar os dados do CAR - Cadastro Ambiental Rural. O sistema também possibilitará controlar informações sobre remanescentes de vegetação nativa, APPs e reservas legais.
  • sábado, 20/10/2012

O NOVO CÓDIGO FLORESTAL: DA PORTEIRA PRA DENTRO COMO FICA A NOVA LEI?


O processo de construção do chamado novo Código Florestal, que na verdade não é um Código, mas uma lei ordinária, foi longo, polêmico, trabalhoso e muito educativo. Numa verdadeira lição de democracia, o projeto foi amplamente discutido com a sociedade, entidades de pesquisa, instituições de ensino, membros do Judiciário, produtores rurais, ambientalistas, ONGs, sindicatos, movimentos independentes, enfim, todos os segmentos. O resultado, além de uma nova lei, foi um Brasil mais consciente, inserido no debate ambiental mundial e certamente, por isto, mais sustentável.
 A nova lei trouxe algumas mudanças que incidirão principalmente nos 30% do território brasileiro que já tiveram sua vegetação suprimida e que produzem alimento, fibra, energia e garantem o superávit da balança comercial. Nos quase 65% de vegetação nativa que o Brasil possui (!!), as regras continuam praticamente as mesmas estabelecidas na legislação anterior.

Enfim, da porteira pra dentro como fica a nova lei?

O Brasil continua sendo o País que tem a lei ambiental mais protetiva do mundo em suas regiões naturais. As áreas de preservação permanente, onde se proíbe qualquer intervenção, protegem onze tipos diferentes de locais considerados frágeis ou importantes, são eles: as margens dos cursos d’água naturais, o entorno de lagos e lagoas naturais, o entorno de reservatórios d’água artificiais, o entorno das nascentes, as encostas com declividade superior a 45°, as restingas como fixadores de dunas ou estabilizadoras de mangues, os manguezais, as bordas dos tabuleiros ou chapadas, os topos de morros, montes, montanhas e serras, áreas com altitude superior a 1800m e finalmente as veredas.

As metragens de proteção na margem dos rios e no entorno das nascentes continuam as mesmas da legislação anterior para áreas em que não houve intervenção, vão de 30 a 500 metros conforme a largura do rio e tem 50 metros de raio no entorno das nascentes. Embora tenha ficado comprovado que a largura do rio não é um critério tecnicamente adequado para estabelecer a margem de mata ciliar necessária para uma proteção eficiente, não houve ambiente político para alterações nos conceitos predeterminados de APP. A discussão foi muito apaixonada, ideológica e contaminada por um romantismo urbano que desconhece a realidade em campo, o que acabou por prejudicar a adoção de critérios tecnicamente mais adequados.

A modificação nas APPs de margem de rios é que a metragem começa a contar da borda da calha do leito regular, ou seja, efetivamente do barranco e não mais do leito maior como na antiga lei. A consequência prática desta alteração, é que as várzeas, quando fora das faixas de proteção exigidas (de 30 a 500 m da borda) não são mais consideradas áreas de preservação e podem ser utilizadas, o que é bom já que praticamente 80% do arroz produzido no País o é nas várzeas.

As porcentagens de reserva legal exigidas pela legislação anterior também permaneceram as mesmas, 80% quando o imóvel estiver em áreas de floresta na Amazônia Legal, 35% quando no cerrado da Amazônia e 20% no restante do País. Novamente o Brasil supera qualquer outra legislação mundial quando uma parte do patrimônio particular, sem qualquer subsídio ou participação do Estado, é destinada a um bem coletivo.

As mudanças em relação a reserva legal são relativas à desnecessidade de averbação na matrícula do imóvel, à possibilidade de cômputo das áreas de preservação permanente para completar o percentual exigido e à possibilidade de compensação fora da propriedade e da bacia hidrográfica, sendo exigido que a área utilizada para compensar a reserva legal faltante esteja no mesmo bioma.

Os imóveis que possuíam até 4 módulos fiscais até a data de 22 de julho de 2008 não precisarão completar o percentual de reserva legal faltante para atingir o percentual exigido, sendo a vegetação nativa existente naquela data suficiente para a regularização ambiental da propriedade. Assim também é a regra que não exige complementação da reserva legal para aquele que suprimiu a vegetação respeitando a legislação vigente à época da supressão.

Aquele que não foi autuado (multado ou embargado) até 28 de maio de 2008 por não possuir reserva legal ou por não ter íntegras as áreas de preservação permanente, não poderá mais receber tais autuações por estes motivos. A intenção da nova lei é dar oportunidade de regularização respeitando a história, a atividade, a boa fé e a dignidade do produtor.

Trata-se de uma mudança não só legal, mas de conceitos, o inicio de um processo de valorização da natureza em que os serviços ambientais oferecidos pelo meio ambiente poderão ser convertidos em dinheiro. Além disso, as medidas necessárias para implantação de práticas sustentáveis terão incentivos, como facilitação de acesso a crédito e isenção de impostos.

O novo Código tem como objetivo principal proteger o meio ambiente, sem inviabilizar as atividades que estão sendo desenvolvidas e disciplinando a forma de desenvolvê-las de ora em diante. Como instrumento desta organização foi instituído o Cadastro Ambiental Rural (CAR) que será obrigatório para todas as propriedades rurais do País.

O CAR será declaratório, assim como o Imposto de Renda que pode ser feito diretamente pelo contribuinte no site da Receita Federal. O Ministério do Meio Ambiente adquiriu as imagens necessárias e o produtor irá completar o cadastro no site dos órgãos ambientais sobre estas imagens, indicando onde estão suas áreas de preservação permanente e remanescentes que podem ser utilizados como reserva legal.

Para as propriedades acima de 4 módulos fiscais será necessário um mapa, que não precisa ser georreferenciado, mas que necessita de memorial descritivo e indicação das coordenadas geográficas com pelo menos um ponto de amarração do perímetro. Para as áreas com menos de 4 módulos fiscais o procedimento será simplificado sem a necessidade do mapa ou memorial, bastando um croqui.

Os produtores terão o prazo de um ano da implantação do CAR para fazer o cadastro que, uma vez realizado, será a base da informação dos Estados na elaboração dos seus Programas de Regularização Ambiental (PRA). Esses programas deverão ser instituídos por lei por cada um dos Estados da Federação de acordo com as potencialidades e fragilidades locais e formarão o conjunto de regras que servirá de roteiro para as regularizações ambientais necessárias.

É importante destacar que algumas situações poderão causar dúvida, pois não tem sua solução prevista pela nova lei, como por exemplo os TACs (termos de ajustamento de conduta) já assinados.

A interpretação de alguns juristas é de que o termo tem natureza de contrato e que como foi assinado conforme a lei vigente não pode ser revogado ou renegociado, no entanto, entendo que se trata, como o próprio nome diz, de um ajustamento da conduta ilegal a uma lei vigente e que se esta lei não está mais vigente, o termo ainda não cumprido não pode continuar válido. Todos os TACs em andamento, portanto, podem ser revistos.

Por Samanta Pineda, advogada ambiental e assessora jurídica da Frente Parlamentar da Agropecuária

Renato Ponzio Scardoelli


terça-feira, 16 de outubro de 2012

APOSENTADORIA APLICADA COMO RESERVA POR UM DOS CÔNJUGES DEVE SER PARTILHADA EM INVENTÁRIO


Os proventos de aposentadoria investidos em aplicação financeira por cônjuge casado em regime de comunhão universal de bens integram o patrimônio comum do casal, porque deixam de ter caráter alimentar. Por esse motivo, o valor aplicado, inclusive os rendimentos, deve ser partilhado no momento em que sociedade conjugal for extinta. 
Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso especial de uma servidora pública aposentada. A Turma considerou que os proventos de aposentadoria somente são considerados bem particular, excluído da comunhão, enquanto mantiverem caráter alimentar em relação ao cônjuge que os recebe. 
Após a morte do ex-marido da servidora (na ocasião, eles já estavam separados), foi aberto inventário para partilha dos bens adquiridos à época do matrimônio, já que se casaram em regime de comunhão universal. Entre esses bens, foram incluídos proventos de aposentadoria da mulher, aplicados como reserva patrimonial durante a vigência do casamento. 

ECONOMIA DO CASAL 

Para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), os valores recebidos por qualquer dos cônjuges até a separação de fato do casal comunicam-se, sendo irrelevante a origem, pois constituíam economia do casal, porém os valores recebidos depois da separação fática não se comunicam, pois a separação põe fim ao regime de bens. 
No recurso especial direcionado ao STJ, a aposentada sustentou que os proventos de aposentadoria recebidos constituem patrimônio exclusivo e não se comunicam durante a vigência da sociedade conjugal. 
Alegou que a decisão do TJRS ofendeu os artigos 1.659, inciso IV, e 1.668, inciso V, ambos do Código Civil (CC). De acordo com esses dispositivos, ficam excluídos da comunhão: as obrigações provenientes de atos ilícitos; os bens de uso pessoal; os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge; as pensões e outras rendas semelhantes. 

CASO SIMILAR 

Ao analisar o caso, o ministro Marco Buzzi, relator do recurso especial, mencionou uma situação similar, amparada em jurisprudência pacificada no STJ. Segundo o ministro, as verbas recebidas a título de indenização trabalhista, mesmo após a dissolução do casamento, devem ser partilhadas entre o casal. 

O relator explicou que o STJ adota o entendimento de que “a diminuição salarial experimentada por um dos cônjuges repercute na esfera patrimonial do outro, que passa a dispor de modo mais intenso de seus vencimentos para fazer frente às despesas correntes do lar”. 

Portanto, já que não existem precedentes referentes à hipótese idêntica à analisada, ele entendeu que deveria seguir a mesma linha de raciocínio adotada nos casos de indenização trabalhista. 

DEVER LEGAL 

“Estabelecida a sociedade conjugal, ambos os consortes passam imediatamente a obedecer ao dever legal de mútua assistência (artigo 1.566, III, do CC), sendo ainda responsáveis pelos encargos da família (artigo 1.565, caput, do CC) e, por decorrência, obrigados a concorrer, na proporção de seus bens e dos rendimentos do trabalho, para o sustento da família e educação dos filhos, qualquer que seja o regime patrimonial (artigo 1.568 do CC)”, afirmou Buzzi. 

Segundo o relator, a interpretação literal dos artigos 1.668, inciso V, e 1.659, incisos VI e VII, conduz ao entendimento de que os valores obtidos pelo trabalho individual de cada cônjuge seriam incomunicáveis, impedindo a comunhão até mesmo dos bens adquiridos com tais vencimentos. 

“No entanto, sempre asseverando a manifesta contradição de tal exegese com o sistema, é corrente na doutrina brasileira que referidas disposições atinentes à incomunicabilidade dos vencimentos, salários e outras verbas reclamam interpretação em sintonia e de forma sistemática com os deveres instituídos por força do regime geral do casamento”, argumentou. 

SOBRAS

Para Buzzi, não é possível considerar imunes as verbas obtidas pelo trabalho pessoal de cada cônjuge, ou proventos e pensões, nem mesmo aptos a formar uma reserva particular, pois o casamento institui obrigação de mútua assistência e de manutenção do lar por ambos os cônjuges. 

Ele explicou que os salários, proventos e outras verbas periódicas são impenhoráveis, conforme o Código de Processo Civil, e incomunicáveis, como estabelece o CC, devido à necessidade de manter a garantia alimentar ao titular desses valores. Entretanto, no caso da incomunicabilidade, explicou que a proteção deve ser compatível com os deveres recíprocos de sustento e auxílio mútuo entre os cônjuges. 

“Nesse sentido, quando ultrapassado o lapso de tempo correspondente ao período em que são periodicamente percebidas as verbas, havendo sobras, esse excesso deixa de possuir natureza alimentar”, afirrmou. 

Diante disso, a Quarta Turma manteve a decisão do TJRS, entendendo ser lícita a inclusão das verbas referidas entre os bens a serem partilhados no inventário. 

REsp 1053473

IMÓVEL COMERCIAL NÃO É PENHORADO


Devedores estão conseguindo na Justiça impedir a penhora de imóveis comerciais. Decisões das esferas estadual e trabalhista têm negado pedidos de bloqueio, desde que seja o único bem do proprietário e o valor do aluguel, utilizado para sua subsistência. 
As decisões vão além do que estabelece a Lei nº 8.009, de 1990, que trata da impenhorabilidade do bem de família. Em agosto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia ampliado essa proteção, por meio da edição da Súmula nº 486. O texto diz que imóvel residencial não pode ser penhorado, ainda que esteja alugado para terceiro. Deve-se comprovar, porém, que o valor da locação é destinado ao sustento da família. 
Essa prova também está sendo levada a casos envolvendo imóveis comerciais. A tese foi aceita recentemente pela 67ª Vara do Trabalho de São Paulo. A devedora argumentou que o aluguel do seu imóvel comercial, no valor de R$ 2.750, representaria 65% da sua renda atual. Alegou ainda ter elevados gastos com tratamento de saúde que, só no ano passado, consumiu R$ 12 mil. 

Para comprovar a situação de sua cliente, a advogada Danielle Pereira Silva, do escritório Barros Ribeiro Advogados, afirma ter apresentado declaração de Imposto de Renda para demonstrar no processo que ela não tem nenhum imóvel residencial em seu nome e que o aluguel do espaço comercial seria essencial para sua sobrevivência. 

Na decisão, a juíza Renata Mendes Cardoso entendeu que o aluguel do imóvel comercial "contribui substancialmente para seu sustento". Segundo ela, não é "finalidade da execução promover o estado de miserabilidade do devedor, retirando-lhe a condição de prover a própria subsistência". A decisão ainda cita acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) nesse mesmo sentido. 
Para Danielle, a decisão ampliou ainda mais o que dispõe a súmula do STJ e estaria em consonância com a intenção expressa na Lei nº 8.009, de 1990, de proteger a unidade familiar. 
No Rio Grande do Sul, a 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça (TJ-RS) também decidiu a favor de uma proprietária de um imóvel comercial alugado que sofria uma execução judicial ajuizada por um banco. Os desembargadores impediram a penhora do imóvel por considerá-lo como único bem de família e sua única fonte de renda e sustento.

A DECISÃO FOI UNÂNIME. 

De acordo com o advogado Ricardo Trotta, do Ricardo Trotta Sociedade de Advogados, essas decisões resgatam a intenção do legislador de garantir a subsistência da família. Ele atuou em um processo em que o magistrado encontrou um meio termo. No caso, o devedor aluga sua garagem para fins comerciais.

O juiz Henrique Vergueiro Loureiro, da 1ª Vara Cível do Foro Regional do Tatuapé, em São Paulo, determinou a penhora de 30% do valor do aluguel, no caso de R$ 200. Os valores deveriam ser transferidos mensalmente ao credor, até a quitação da dívida, de cerca de R$ 9 mil. 

Para o advogado João Gilberto Goulart, titular do Goulart & Colepicolo Advogados, o raciocínio válido para o imóvel residencial deve ser aplicado também para o comercial. "A destinação do imóvel é irrelevante para fins de proteção. O importante é que se preserve a subsistência do núcleo familiar com a impenhorabilidade do único bem", afirma. 

Mesmo o devedor que reside em imóvel comercial tem conseguido impedir a penhora na Justiça. Foi o que ocorreu em um caso analisado pelo STJ. O relator, ministro Luiz Fux, atualmente no Supremo Tribunal Federal (STF), observou que o uso da sede da empresa como moradia da família ficou comprovado, o que exigia do Judiciário uma posição "humanizada". 

Para o ministro, expropriar aquele imóvel significaria o mesmo que alienar o bem de família. "A lei deve ser aplicada tendo em vista os fins sociais a que ela se destina", diz na decisão. 

Adriana Aguiar - De São Paulo


PARTILHA DE BENS NA DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL APÓS A LEI 9.278 DISPENSA PROVA DE ESFORÇO COMUM


A partir da vigência da Lei 9.278/96, os bens adquiridos a título oneroso na constância da união estável, individualmente ou em nome do casal, pertencem a ambos, dispensada a prova de que sua aquisição decorreu do esforço comum dos companheiros. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) não acolheu o recurso de ex-companheira, que pretendia ver partilhados somente os bens adquiridos em nome de ambos e não todos os bens acrescentados ao patrimônio durante a constância da união.

A mulher ajuizou a ação de dissolução de sociedade de fato contra o ex-companheiro, com quem manteve união estável de 1986 a 1997. Ele não apresentou contestação e foi decretada sua revelia. Somente em alegações finais, sustentou cerceamento de defesa e pediu o reconhecimento de seu direito à meação de todos os bens que teriam sido adquiridos na constância da união estável.

O juízo de primeiro grau decretou o fim da união estável com a partilha de todos os bens adquiridos durante a vigência da união estável, com base na Lei 9.278. Interposta apelação pela mulher, o Tribunal de Justiça de Pernambuco manteve a sentença. “Separação ocorrida após a vigência da Lei 9.278, devendo ser partilhados os bens pelos companheiros. Sentença que merece subsistir”, decidiu o TJ.

Fora do pedido

No recurso especial ao STJ, a mulher afirmou que as instâncias ordinárias não poderiam ter determinado a partilha de todos os bens adquiridos durante a união, pois essa decisão teria extrapolado o pedido feito na ação, que se limitava à dissolução da sociedade com partilha dos bens adquiridos exclusivamente em nome de ambos. 

“Se o recorrido [ex-companheiro] pretendesse a partilha dos demais bens de propriedade da recorrente [ex-companheira], deveria ter contestado. Como não o fez, só lhe restaria então entrar com ação própria, com pedido específico de partilha dos bens que não foram colacionados, uma vez que não foram objeto da presente ação”, disse a defesa da mulher.

A ex-companheira alegou ainda que o ato jurídico cuja dissolução se buscou por meio da ação – a constituição da sociedade de fato – se deu em 24 de dezembro de 1986, e que a legislação aplicável deveria ser aquela vigente à época.

Em seu voto, o relator, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que às uniões estáveis dissolvidas após a publicação da Lei 9.278, ocorrida em 13 de maio de 1996, aplicam-se as suas disposições, conforme já pacificado pelo STJ. No caso, a dissolução ocorreu em março de 1997.

“Os bens adquiridos a título oneroso enquanto perdurar a união estável, individualmente ou em nome do casal, a partir da vigência da Lei 9.278, pertencem a ambos, excepcionado o direito de disporem de modo diverso em contrato escrito, ou se a aquisição ocorrer com o produto de bens adquiridos em período anterior ao início da união”, afirmou o ministro.

Consequência natural

Sobre a alegação de que a decisão contestada teria extrapolado os limites da ação, o ministro assinalou que a meação é consequência natural do pedido de dissolução da união estável, motivo pelo qual o julgador não fica adstrito ao pedido de partilha dos bens relacionados na petição inicial da demanda. 

Segundo o relator, mesmo havendo a revelia da outra parte, a autora da ação não demonstrou a ocorrência das hipóteses legais que poderiam afastar a presunção de condomínio sobre o patrimônio adquirido exclusivamente em seu nome. Com base em precedentes do STJ, o ministro disse que a Lei 9.278, ao contrário do regime legal anterior, “não exige prova de que a aquisição dos bens decorreu do esforço comum de ambos os companheiros para fins de partilha”.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça