terça-feira, 16 de outubro de 2012

IMÓVEL COMERCIAL NÃO É PENHORADO


Devedores estão conseguindo na Justiça impedir a penhora de imóveis comerciais. Decisões das esferas estadual e trabalhista têm negado pedidos de bloqueio, desde que seja o único bem do proprietário e o valor do aluguel, utilizado para sua subsistência. 
As decisões vão além do que estabelece a Lei nº 8.009, de 1990, que trata da impenhorabilidade do bem de família. Em agosto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia ampliado essa proteção, por meio da edição da Súmula nº 486. O texto diz que imóvel residencial não pode ser penhorado, ainda que esteja alugado para terceiro. Deve-se comprovar, porém, que o valor da locação é destinado ao sustento da família. 
Essa prova também está sendo levada a casos envolvendo imóveis comerciais. A tese foi aceita recentemente pela 67ª Vara do Trabalho de São Paulo. A devedora argumentou que o aluguel do seu imóvel comercial, no valor de R$ 2.750, representaria 65% da sua renda atual. Alegou ainda ter elevados gastos com tratamento de saúde que, só no ano passado, consumiu R$ 12 mil. 

Para comprovar a situação de sua cliente, a advogada Danielle Pereira Silva, do escritório Barros Ribeiro Advogados, afirma ter apresentado declaração de Imposto de Renda para demonstrar no processo que ela não tem nenhum imóvel residencial em seu nome e que o aluguel do espaço comercial seria essencial para sua sobrevivência. 

Na decisão, a juíza Renata Mendes Cardoso entendeu que o aluguel do imóvel comercial "contribui substancialmente para seu sustento". Segundo ela, não é "finalidade da execução promover o estado de miserabilidade do devedor, retirando-lhe a condição de prover a própria subsistência". A decisão ainda cita acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) nesse mesmo sentido. 
Para Danielle, a decisão ampliou ainda mais o que dispõe a súmula do STJ e estaria em consonância com a intenção expressa na Lei nº 8.009, de 1990, de proteger a unidade familiar. 
No Rio Grande do Sul, a 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça (TJ-RS) também decidiu a favor de uma proprietária de um imóvel comercial alugado que sofria uma execução judicial ajuizada por um banco. Os desembargadores impediram a penhora do imóvel por considerá-lo como único bem de família e sua única fonte de renda e sustento.

A DECISÃO FOI UNÂNIME. 

De acordo com o advogado Ricardo Trotta, do Ricardo Trotta Sociedade de Advogados, essas decisões resgatam a intenção do legislador de garantir a subsistência da família. Ele atuou em um processo em que o magistrado encontrou um meio termo. No caso, o devedor aluga sua garagem para fins comerciais.

O juiz Henrique Vergueiro Loureiro, da 1ª Vara Cível do Foro Regional do Tatuapé, em São Paulo, determinou a penhora de 30% do valor do aluguel, no caso de R$ 200. Os valores deveriam ser transferidos mensalmente ao credor, até a quitação da dívida, de cerca de R$ 9 mil. 

Para o advogado João Gilberto Goulart, titular do Goulart & Colepicolo Advogados, o raciocínio válido para o imóvel residencial deve ser aplicado também para o comercial. "A destinação do imóvel é irrelevante para fins de proteção. O importante é que se preserve a subsistência do núcleo familiar com a impenhorabilidade do único bem", afirma. 

Mesmo o devedor que reside em imóvel comercial tem conseguido impedir a penhora na Justiça. Foi o que ocorreu em um caso analisado pelo STJ. O relator, ministro Luiz Fux, atualmente no Supremo Tribunal Federal (STF), observou que o uso da sede da empresa como moradia da família ficou comprovado, o que exigia do Judiciário uma posição "humanizada". 

Para o ministro, expropriar aquele imóvel significaria o mesmo que alienar o bem de família. "A lei deve ser aplicada tendo em vista os fins sociais a que ela se destina", diz na decisão. 

Adriana Aguiar - De São Paulo


PARTILHA DE BENS NA DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL APÓS A LEI 9.278 DISPENSA PROVA DE ESFORÇO COMUM


A partir da vigência da Lei 9.278/96, os bens adquiridos a título oneroso na constância da união estável, individualmente ou em nome do casal, pertencem a ambos, dispensada a prova de que sua aquisição decorreu do esforço comum dos companheiros. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) não acolheu o recurso de ex-companheira, que pretendia ver partilhados somente os bens adquiridos em nome de ambos e não todos os bens acrescentados ao patrimônio durante a constância da união.

A mulher ajuizou a ação de dissolução de sociedade de fato contra o ex-companheiro, com quem manteve união estável de 1986 a 1997. Ele não apresentou contestação e foi decretada sua revelia. Somente em alegações finais, sustentou cerceamento de defesa e pediu o reconhecimento de seu direito à meação de todos os bens que teriam sido adquiridos na constância da união estável.

O juízo de primeiro grau decretou o fim da união estável com a partilha de todos os bens adquiridos durante a vigência da união estável, com base na Lei 9.278. Interposta apelação pela mulher, o Tribunal de Justiça de Pernambuco manteve a sentença. “Separação ocorrida após a vigência da Lei 9.278, devendo ser partilhados os bens pelos companheiros. Sentença que merece subsistir”, decidiu o TJ.

Fora do pedido

No recurso especial ao STJ, a mulher afirmou que as instâncias ordinárias não poderiam ter determinado a partilha de todos os bens adquiridos durante a união, pois essa decisão teria extrapolado o pedido feito na ação, que se limitava à dissolução da sociedade com partilha dos bens adquiridos exclusivamente em nome de ambos. 

“Se o recorrido [ex-companheiro] pretendesse a partilha dos demais bens de propriedade da recorrente [ex-companheira], deveria ter contestado. Como não o fez, só lhe restaria então entrar com ação própria, com pedido específico de partilha dos bens que não foram colacionados, uma vez que não foram objeto da presente ação”, disse a defesa da mulher.

A ex-companheira alegou ainda que o ato jurídico cuja dissolução se buscou por meio da ação – a constituição da sociedade de fato – se deu em 24 de dezembro de 1986, e que a legislação aplicável deveria ser aquela vigente à época.

Em seu voto, o relator, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que às uniões estáveis dissolvidas após a publicação da Lei 9.278, ocorrida em 13 de maio de 1996, aplicam-se as suas disposições, conforme já pacificado pelo STJ. No caso, a dissolução ocorreu em março de 1997.

“Os bens adquiridos a título oneroso enquanto perdurar a união estável, individualmente ou em nome do casal, a partir da vigência da Lei 9.278, pertencem a ambos, excepcionado o direito de disporem de modo diverso em contrato escrito, ou se a aquisição ocorrer com o produto de bens adquiridos em período anterior ao início da união”, afirmou o ministro.

Consequência natural

Sobre a alegação de que a decisão contestada teria extrapolado os limites da ação, o ministro assinalou que a meação é consequência natural do pedido de dissolução da união estável, motivo pelo qual o julgador não fica adstrito ao pedido de partilha dos bens relacionados na petição inicial da demanda. 

Segundo o relator, mesmo havendo a revelia da outra parte, a autora da ação não demonstrou a ocorrência das hipóteses legais que poderiam afastar a presunção de condomínio sobre o patrimônio adquirido exclusivamente em seu nome. Com base em precedentes do STJ, o ministro disse que a Lei 9.278, ao contrário do regime legal anterior, “não exige prova de que a aquisição dos bens decorreu do esforço comum de ambos os companheiros para fins de partilha”.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

CÓDIGO FLORESTAL DISPENSA AVERBAÇÃO DE RESERVA LEGAL


A 4ª Câmara de Direito Civil do TJ/SC, em decisão do desembargador Luiz Fernando Boller, julgou agravo de instrumento interposto por um comerciante de Braço do Norte, que objetivava compelir um casal de administradores de empresa, de quem adquiriu a propriedade de um sítio rural, a promover a averbação de reserva legal de proteção ambiental à margem da respectiva matrícula no Cartório do Registro de Imóveis.
Contrariados, os vendedores alegaram que a escritura pública não lhes atribui tal responsabilidade. Em seu voto, Boller destacou que, de fato, a lei 4.777/65 estatuía tal obrigação na forma de limitação administrativa do Poder Público, com o objetivo de restringir o exercício da posse e propriedade para salvaguardar a conservação mínima do meio ambiente. Entretanto, esclarece o relator, esta norma foi expressamente revogada pelo novo Código Florestal, instituído pela lei 12.651/12.

E em que pese tenha definido a reserva legal como a "área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural (...) com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção da fauna silvestre e da flora nativa", a nova legislação dispensou a respectiva averbação na matrícula do imóvel.

"A área de reserva legal deverá ser registrada no órgão ambiental competente por meio de inscrição no CAR - Cadastro Ambiental Rural, providência que desobriga a averbação no Cartório de Registro de Imóveis", acrescentou o relator, com base no disposto no artigo 18 do novo código.

Diante disto, por entender que não mais subsiste a obrigatoriedade de se efetuar a averbação da reserva legal à margem da matrícula do imóvel, o colegiado negou provimento ao recurso. A decisão foi unânime.

Processo: 2011.079146-6

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

SUB JUDICE: 640 CANDIDATOS A PREFEITO CORREM O RISCO DE GANHAR E NÃO LEVAR

A uma semana do primeiro turno das eleições municipais, 640 candidatos a prefeito em 602 cidades podem ir para as urnas no próximo domingo ainda sem saber se poderão tomar posse caso sejam eleitos. Ou seja, podem até ganhar, mas correm o risco de não assumir o cargo. Isso acontece porque esses políticos estão com as candidaturas indeferidas ou cassadas, e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ainda não julgou os recursos. Até o momento, a Corte analisou 241 processos referentes a candidaturas ao Executivo, incluindo casos de concorrentes que tiveram o registro aprovado em instâncias anteriores e contestado por partidos adversários ou pelo Ministério Público Eleitoral (MPE).
No Rio, 32 candidatos em 26 cidades tiveram seus registros indeferidos ou cassados. É o segundo estado onde, proporcionalmente, há mais municípios com pelo menos um concorrente à prefeitura nesta situação. Há prefeitos no estado que concorrem à reeleição sem ter a certeza de que sua candidatura vai ser liberada. São os casos de Rachid Elmor (PDT), de Paty do Alferes, Rafael Miranda (PP), de Cachoeiras de Macacu, e Rosinha Garotinho (PR), de Campos dos Goytacazes. Também existem ex-prefeitos que tentam voltar ao cargo e aguardam recursos. Em Tanguá, o número de pendurados atinge metade dos aspirantes ao Executivo. Para tentar garantir a vaga, todos recorreram ao TSE.
— Infelizmente, a legislação admite que isso ocorra, o que só gera instabilidade e insegurança jurídica e institucional. Trata-se dos candidatos eleitos com pedido de registro sub judice, ou seja, aqueles cujos registros foram indeferidos, mas recorreram das decisões nos tribunais regionais eleitorais ou ao TSE. Assim, o candidato concorre com o registro de candidatura indeferido, porém à espera do julgamento de um recurso visando à reforma da decisão de indeferimento — explicou o coordenador do 5º Centro de Apoio Operacional das Promotorias Eleitorais do Rio, Rodrigo Molinaro Zacharias.
O fato de a candidatura não estar julgada até a eleição pode causar insegurança tanto para o candidato quanto para o eleitor. O político pode ter dificuldades de encontrar doadores, já que não há garantia de que ele terá o registro aprovado. E é ruim para o eleitor, que pode votar em um concorrente que, depois da eleição, corre o risco de ser considerado inapto. Com isso, o voto do eleitor no candidato é anulado.
De acordo com resolução do TSE, nenhum candidato com registro indeferido pode ser diplomado — ato em que a Justiça oficializa quem foi eleito —, mesmo que exista recurso. Caso isso ocorra e o candidato a prefeito mais votado não tiver a maioria absoluta dos votos válidos, o segundo colocado na eleição tomará posse. Essa situação vai perdurar até o julgamento final do registro do primeiro colocado. Entretanto, se o mais votado estiver com o registro indeferido e obtiver mais da metade dos votos válidos, será preciso convocar uma nova eleição. Até lá, o presidente da Câmara Municipal assumirá o cargo de prefeito interinamente. Ainda assim, existe a possibilidade de políticos eleitos, e ainda com o registro indeferido, sejam diplomados, amparados por liminares.
O TSE informou que os casos deverão ser julgados até o fim de dezembro, data das diplomações. Até agora, 5.223 recursos sobre registro chegaram à Corte. Pouco menos de um terço foi julgado. Cerca de 40% dos processos são sobre a Lei da Ficha Limpa.
— Muitos candidatos que deveriam ter recorrido ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RJ) perderam o prazo e entraram direto com recurso no TSE. Isso aconteceu em pelo menos 48 candidaturas do Rio — disse o presidente do TRE-RJ, desembargador Luiz Zveiter, explicando que isso sobrecarrega o TSE.

O PR é, proporcionalmente, o partido com o maior número de candidaturas a prefeito indeferidas. São 48 nessa situação entre os 703 políticos da sigla que concorrem ao Executivo.
— Às vésperas da eleição, o político desiste, e o partido indica outro. O eleitor não tem tempo de se informar. Ao digitar o número do candidato que renunciou, os eleitores verão a foto dele, já que os dados estão na urna. O cidadão vota em um e elege outro — explica Molinaro.
Essa constatação é corrente entre os membros do MPE, que defendem mudança na lei. Na tentativa de impedir que os partidos adotem essa prática, o procurador regional eleitoral do Rio, Maurício da Rocha Ribeiro, recomendou que as siglas não substituam os candidatos a menos de dez dias das eleições, sem justa causa, sob pena de caracterizar fraude eleitoral.
Há ainda 924 candidatos a prefeito que estão com o registro deferido, mas o MPE ou coligação adversária ainda contestam a decisão. Pode acontecer de o TSE mudar o entendimento das instâncias anteriores, e o político, que até então estava aprovado, fica impedido de assumir se eleito.
Apenas um dos três candidatos que disputam a prefeitura de Cachoeiras de Macacu teve a candidatura deferida, sem pendências judiciais. O atual prefeito, Rafael Miranda (PP), que tenta a reeleição, teve o registro negado pelo TRE e recorreu. O registro do ex-prefeito Cica Machado (PSC) foi aprovado, mas a coligação que apoia o prefeito tenta mudar a decisão.
— Cachoeiras de Macacu é uma cidade de interior, mas não é pequena. A eleição é muito disputada. A apuração parece final de Copa do Mundo. Tem telão na praça, e todos vibram a cada totalização dos votos. Há até brigas de torcida — explicou a juíza eleitoral da cidade, Carla Regina da Costa.
Procurado pelo GLOBO, Miranda não estava na prefeitura no horário de expediente e não retornou as ligações.
Na vizinha Tanguá, dos sete políticos que concorrem à prefeitura, quatro tiveram candidatura indeferida, sendo que apenas um deles não recorreu. Lá, os eleitores se dividem entre os descrentes da política e aqueles que valorizam a intenção de voto ao extremo.
— Outro dia, prenderam cabos eleitorais de um candidato a prefeito comprando votos por R$ 100. Não dá para jogar o voto fora. Sou a favor de quem tem ficha limpa — disse a estudante, Paola dos Santos, de 17 anos.

domingo, 30 de setembro de 2012

A IMPENHORABILIDADE DE DEPÓSITO EM CADERNETA DE POUPANÇA LIMITA-SE AO VALOR TOTAL DE 40 SALÁRIOS MÍNIMOS, MESMO QUE O DINHEIRO ESTEJA DEPOSITADO EM MAIS DE UMA APLICAÇÃO DESSA NATUREZA. ESSE É O ENTENDIMENTO DA 3ª TURMA DO STJ.

No caso julgado, o recurso foi interposto por fiadores em contrato de locação, no curso de uma ação de despejo cumulada com cobrança, já em fase de execução. Eles tinham seis cadernetas de poupança. A Justiça paulista determinou o bloqueio de aproximadamente R$ 11 mil que havia em uma das contas.
No recurso, os fiadores alegaram que, mesmo havendo pluralidade de contas, deveria ser analisado o valor constante em todas elas, pois o valor total poderia ser necessário para seu sustento.
A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, analisou que o objetivo da impenhorabilidade de depósito em poupança é, claramente, garantir um "mínimo existencial" ao devedor, com base no princípio da dignidade da pessoa humana. "Naturalmente, essa garantia somente pode ser efetivada caso incida sobre o montante total visado pelo legislador, não sobre o número de contas mantidas pelo devedor", entendeu a ministra.
·                     25/09/2012
·                     Processo relacionado: REsp 1.231.123
VEJA A ÍNTEGRA DA DECISÃO.
___________
RECURSO ESPECIAL Nº 1.231.123 - SP (2011⁄0003344-6)
RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE: A.S. E OUTRO
ADVOGADO: ANTÔNIO CARLOS AGUIAR E OUTRO(S)
RECORRIDO: BOA ESPERANÇA COMERCIAL E ADMINISTRADORA LTDA E OUTROS
ADVOGADO: PATRICIA SIMON
EMENTA
PROCESSO CIVIL. IMPENHORABILIDADE DE DEPÓSITOS EM CADERNETA DE POUPANÇA. EXISTÊNCIA DE MAIS DE UMA APLICAÇÃO. EXTENSÃO DA IMPENHORABILIDADE A TODAS ELAS, ATÉ O LIMITE DE 40 SALÁRIOS MÍNIMOS FIXADO EM LEI.
1. O objetivo do novo sistema de impenhorabilidade de depósito em caderneta de poupança é, claramente, o de garantir um mínimo existencial ao devedor, como corolário do princípio da dignidade da pessoa humana. Se o legislador estabeleceu um valor determinado como expressão desse mínimo existencial, a proteção da impenhorabilidade deve atingir todo esse valor, independentemente do número de contas-poupança mantidas pelo devedor.
2. Não se desconhecem as críticas, "de lege ferenda", à postura tomada pelo legislador, de proteger um devedor que, em lugar de pagar suas dívidas, acumula capital em uma reserva financeira. Também não se desconsidera o fato de que tal norma possivelmente incentivaria os devedores a, em lugar de pagar o que devem, depositar o respectivo valor em caderneta de poupança para burlar o pagamento. Todavia, situações específicas, em que reste demonstrada postura de má-fé, podem comportar soluções também específicas, para coibição desse comportamento. Ausente a demonstração de má-fé, a impenhorabilidade deve ser determinada.
3. Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 02 de agosto de 2012 (Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
Cuida-se de recurso especial interposto por A.S. E OUTRO, com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional.
Ação: de despejo cumulada com cobrança, em fase de execução, ajuizada por BOA ESPERANÇA COMERCIAL E ADMINISTRADORA LTDA, PEDRA GRANDE SOCIEDADE CIVIL LTDA., UNIBANCO SEGUROS S⁄A e ENPLANTA ENGENHARIA LTDA, em face dos agravantes. Ressalte-se que os agravantes são fiadores do contrato de locação de imóvel firmado entre as agravadas e HENRIQUE CLÁUDIO - ME.
Decisão interlocutória: deferiu o pedido de desbloqueio de conta poupança, formulado pelos recorrentes, com fundamento no art. 649, X, do CPC.
Agravo de instrumento: interposto pelos recorridos, ao argumento de que os recorrentes são titulares de mais de uma conta poupança, de modo que a impenhorabilidade disciplinada na Lei deve abranger apenas uma delas.
Acórdão: deu provimento ao agravo de instrumento, para determinar a manutenção do bloqueio da referida conta bancária, no valor de R$ 10.982,33 (dez mil, novecentos e oitenta e dois reais e trinta e três centavos), nos termos da seguinte ementa:
DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - PENHORA 'ON LINE' - CONSTRIÇÃO DE NUMERÁRIO EM CONTA POUPANÇA - INOVAÇÃO DO ARTIGO 649, X, DO CPC - PLURALIDADE DE CONTAS BANCÁRIAS - BLOQUEIO MANTIDO. A inovação dada pela Lei 11.382⁄2006, constante no artigo 649, X, do Código de Processo Civil, conferiu proteção ao pequeno poupador, reservando-lhe a manutenção de caderneta de poupança no limite-teto de quarenta salários mínimos. Todavia, a observância desse artigo comporta ser conjugada às circunstâncias do caso concreto, não podendo ser aplicado isoladamente. havendo pluralidade de contas bancárias, inclusive de poupança, fica mantido o bloqueio de uma delas.
Recurso especial: alega violação dos arts. 649, X, do CPC. Sustenta que quantia depositada em caderneta de poupança até quarenta salários mínimos é absolutamente impenhorável. Afirma que mesmo que haja pluralidade de contas bancárias, deve-se analisar o valor constante em todas elas, pois pode ser que o valor total seja necessário para o seu sustento.
Admissibilidade: o recurso foi admitido na origem.
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
Cinge-se a lide a estabelecer se a impenhorabilidade disposta no art. 649, X, do CPC, pode ser estendida a mais de uma caderneta de poupança (até o limite de 40 salários mínimos) ou se, dada a manutenção de múltiplas aplicações dessa natureza, a impenhorabilidade deve ficar restrita apenas a uma delas.
O principal fundamento que sustenta o acórdão recorrido é o de que "os agravados possuem titularidade de mais de uma conta bancária, no total de 6 (seis)", de modo que não haveria sentido em manter bloqueada mais de uma. Para o TJ⁄SP, a aplicação do art. 649, X, do CPC deve "ser conjugada às circunstâncias do caso concreto, não podendo ser aplicado isoladamente, sob pena de prestigiar-se maus pagadores, que podem criar expedientes outros para inibir a constrição".
Essas ponderações são impugnadas no recurso especial sob o fundamento de que a "alegação é absurda e absolutamente desprovida de razoabilidade". Para demonstrá-lo, os recorrentes formulam a seguinte pergunta: "caso uma pessoa tenha 10 (dez) contas bancárias, 9 (nove) com saldo de R$ 1,00 (um real) e uma com saldo de R$ 11.000,00 (onze mil reais), sendo este valor vital para sua alimentação (como no presente caso), poderia ser penhorado esse valor?". A ideia que sustentam é a de que todas as cadernetas de poupança sejam consideradas impenhoráveis, até o limite global de 40 salários mínimos.
A solução da matéria deve passar pela interpretação teleológica do sistema de impenhorabilidade estabelecido pela Lei 11.382⁄2006. Com efeito, o art. 649, X, do CPC, em princípio, dá margem a mais de uma leitura, sendo possível invocá-lo, tanto para defender a posição adotada pelo acórdão recorrido, como aquela defendida pelos recorrentes.
O objetivo do novo sistema de impenhorabilidade de depósito em caderneta de poupança é, claramente, o de garantir um mínimo existencial ao devedor, como corolário do princípio da dignidade da pessoa humana, alçado a fundamento da República Federativa do Brasil pelo art. 1º, III, da CF. A impenhorabilidade, portanto, é determinada para garantir que, não obstante o débito, possa o devedor contar com um numerário mínimo que lhe garanta uma subsistência digna.
Naturalmente, essa garantia somente pode ser efetivada caso incida sobre o montante total visado pelo legislador, não sobre o número de contas mantidas pelo devedor. Com efeito, se a impenhorabilidade estabelecida pelo legislador pauta-se por um valor pré-estabelecido, fixado por Lei como o mínimo existencial, naturalmente esse valor tem de ser tomado, sempre, como o norte final da regra protetiva, independentemente do número de aplicações financeiras dessa natureza mantida pelo devedor.
Posicionando-se contra esse entendimento, ARAKEN DE ASSIS tece as seguintes considerações (in "Revista Jurídica", v. 55, n. 359, p. 21-40, set⁄2007):
"Resta, porém, uma dificuldade: o limite de quarenta salários mínimos se aplica a cada conta de poupança, individualmente considerada, ou ao conjunto dos depósitos, quando o executado é titular de várias contas da mesma natureza? O art. 649, X, não alude à 'única' caderneta de poupança. Todavia, a interpretação restritiva se impõe no caso; do contrário, valores expressivos poderiam ser divididos em várias contas, burlando a finalidade da regra, que é a de proteger a população de baixa renda"
Essa crítica, contudo, não se sustenta. Se fixarmos, como limite da impenhorabilidade, o montante de 40 salários mínimos, mesmo que distribuídos em mais de uma aplicação, não haveria favorecimento algum ao devedor de alta renda mas, em vez disso, uniformidade de tratamento a devedores que, substancialmente, encontram-se em situações equivalentes. O critério seria sempre uno, pautado no valor atribuído pelo legislador como mínimo existencial.
Não se desconhece as críticas, "de lege ferenda", à postura tomada pelo legislador, de proteger um devedor que, em lugar de pagar suas dívidas, acumula capital em uma reserva financeira. Também não se desconsidera o fato de que tal norma possivelmente incentivaria os devedores a, em lugar de pagar o que devem, depositar o respectivo valor em caderneta de poupança para burlar o pagamento. Todavia, situações específicas, em que reste demonstrada postura de má-fé, podem comportar soluções também específicas, para coibição desse comportamento. Nas hipóteses em que a má-fé não esteja demonstrada, contudo - como ocorre nos autos - não resta ao judiciário outra alternativa senão a da aplicação da Lei.
Importante ressaltar, por fim, que em contrarrazões os recorridos ressaltam que a garantia da impenhorabilidade jamais poderia ser estendida a poupanças vinculadas a contas-correntes. Trata-se de uma linha argumentativa muito interessante, mas a matéria, contudo, não foi analisada sob esse enfoque pelo acórdão recorrido, que apenas tomou, como base para decidir, o fato da existência de multiplicidades de aplicações em poupança, sem especificá-las. Assim, seria impossível, diante do Enunciado nº 7 da Súmula⁄STJ, revolver a matéria nesta sede.
Forte nessas razões, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para determinar que a impenhorabilidade dos valores depositados em caderneta de poupança vigore até o limite global de 40 salários mínimos, ainda que depositados em mais de uma aplicação dessa natureza.
Brasília (DF), 02 de agosto de 2012 (Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

PRESCRIÇÃO DAS AÇÕES POR ABANDONO AFETIVO CONTA A PARTIR DA MAIORIDADE DO INTERESSADO



 

O STJ entendeu que o prazo prescricional das ações de indenização por abandono afetivo começa a fluir quando o interessado atinge a maioridade e se extingue, assim, o pátrio poder. A 4ª turma reconheceu a ocorrência de prescrição em ação proposta por filho de 51 anos de idade.

No caso, o filho buscava compensação por danos morais decorrentes de abandono afetivo e humilhações que teriam ocorrido quando era menor de idade. Sustentou que sempre buscou o afeto e reconhecimento de seu genitor que "negligenciou a educação, profissionalização e desenvolvimento pessoal, emocional, social e cultural de seu filho". O autor afirmou ainda que, mesmo sabendo quem era seu pai desde o nascimento, foi reconhecido apenas após 50 anos.

A arguição de prescrição suscitada pelo pai havia sido rejeitada por decisão interlocutória do juízo da 5ª vara Cível do foro Regional da Barra da Tijuca, no RJ. O pai recorreu ao TJ/RJ, que reconheceu a prescrição e julgou extinto o processo com resolução de mérito.

O filho recorreu ao STJ argumentando que o pai tem outros dois filhos aos quais dedicou cuidados emocionais e financeiros integrais, proporcionando-lhes "formação de excelência". De acordo com ele, enquanto conviveu com o pai, sofreu desprezo, discriminação e humilhações repetidas, o que lhe teria causado dor psíquica e prejuízo à formação da personalidade. Alegou também que só houve o reconhecimento da paternidade em 2007, por isso não se poderia falar em decurso do prazo prescricional.

O ministro Luis Felipe Salomão, relator, destacou que a ação de investigação de paternidade é imprescritível, tratando-se de direito personalíssimo, e a sentença que reconhece o vínculo tem caráter declaratório, visando acertar a relação jurídica da paternidade do filho, sem constituir para o autor nenhum direito novo, não podendo o seu efeito retroativo alcançar os efeitos passados das situações de direito.

De acordo com ele, o artigo 392, III, do CC/16, dispunha que o pátrio poder extinguia-se com a maioridade do filho, que, na vigência daquele código, ocorria aos 21 anos completos. "Nessa linha, como o autor nasceu no ano de 1957, fica nítido que o prazo prescricional fluiu a contar do ano de 1978, ainda na vigência do Código Civil de 1916, sendo inequívoco que o pleito exordial cuida de direito subjetivo, dentro do que o código revogado estabelecia como direito pessoal", afirmou.

Salomão ressaltou ainda que não é possível a invocação de prazo prescricional previsto noCC/02, em vigor. Isso porque, como o artigo 177 do CC/16 estabelecia que as ações pessoais prescreviam, ordinariamente, em 20 anos, e como o filho ajuizou a ação buscando compensação por alegados danos morais apenas em outubro de 2008, quando contava 51 anos de idade, fica nítido que operou a prescrição, ainda na vigência do código de 1916.

quarta-feira, 26/9/2012

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

NEGATÓRIA DE PATERNIDADE - EXAME DNA PRÉVIO EM CONSENSO DAS PARTES - MODÊLO DE PETIÇÃO



EXCELENTÍSIMO (A)  SENHOR(A)  DOUTOR(A) JUIZ DE DIREITO DA  COMARCA DE ____________.

                                                CARLOS JOSÉ DE SABREA, RG. 29.356.292-SSP/SP, CPF nº 377.496.208-19, residente e domiciliado à rua José Pinto Guedes, nº 85, na cidade de Marealves-SP, por seu procurador infra-assinado, advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Secção de São Paulo sob nº 28870, com escritório à rua São Paulo, nº 239, na cidade de Iepê-SP, onde recebe intimações de praxe, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor a presente AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE em face de CARLOS ELIAS DOS SANTOS, menor impúbere representado por sua  genItora          Maria Filonema da silva Reales, brasileira, solteira, do lar, ambos residentes e domiciliados na fazenda Recreio, município de Lajes-SP, pelas razões que passa a expor:

I-                                             OS FATOS

1.                                            No final do ano de 1992 o requerente conheceu Maria Filonema da Silva Reales, ocasião em que mantiverem relações sexuais, não se constituindo este fato, contudo, em relacionamento mais íntimo ou duradouro, pois logo se afastaram, configurando aquele contato em passageira aventura. Certo é que Maria Filonema ficou grávida, e nascida a criança no dia 15 de setembro de 1993, passou alegar que o menino era fruto do relacionamento que haviam tido no ano anterior.
2                                             No entanto, embora tenha reconhecido o requerido como seu filho, diga-se de passagem, diante de ameaça e insistência de Maria Filonema da silva Reales, o autor sempre desconfiava de que não era o pai biológico da criança, e por este motivo sempre desejou submeter-se ao exame  de DNA para comprovar que não era o pai do infante. Desde o nascimento da criança até os dias atuais, nunca houve qualquer relação afetiva entre o suplicante e suplicado, não tendo o autor, durante este lapso de tempo, feito qualquer visita á criança. As comunicações entre a genitora do suplicado e autor, esporadicamente, foram motivadas por cobrança de valores relativos à pensão alimentícia.

3.                                             Certo é que passados doze anos do nascimento do infante, Maria Filonema da Silva Reales, aceitou submeter-se a aludido exame, e sendo assim, em comum acordo, compareceram ao Laboratório de Análises Clínicas Boa Saúde Ltda., onde houve a colheita do sangue dos interessados. O material biológico obtido foi enviado ao renomado Instituto Lux et Vita, sediado na cidade de São Paulo-SP.


4.                                   Procedido ao exame, concluiu o Laudo Técnico Pericial, após descrever a técnica utilizada de PCR, que os marcadores polimórficos foram ampliados, destacados por eletroforese e analisados separadamente. Informa a pesquisa que nos locos genéticos estudados, os alelos encontrados no filho estavam presentes na mãe, porém em 10 locos os alelos não estavam presentes no suposto pai. Esclarece que as amostras foram analisadas por duas equipes diferentes em prova e contraprova, e confirmaram os resultados obtidos, declarando que CARLOS JOSÉ DE SABREA NÃO É O PAI BIOLÓGICO DE CARLOS ELIAS DOS SANTOS, que tem por mãe a Sra. Maria Filonema da Silva Reales. O laudo foi firmado pelo Dr. Pedro Lauro Mamaoni .  

II-                                            A EFICÁCIA DO EXAME PELO SISTEMA DNA

1.                                         Ayush Morad Amar, em seu livro Investigação de Paternidade e Maternidade do ABO ao DNA. Cone Editora, pg. 169, discorrendo sobre a eficácia do exame ora em comento, assevera que "...em face da viabilidade da determinação do DNA, os métodos de identificação empregados até hoje não têm mais razão de prosseguir", arrematando, logo em seguida: "Para muitos, a investigação de paternidade pelos métodos ainda em vigor é até ofensiva diante do que representa a identificação pelo DNA."
2.                                          Fernando Simas Filho, in, “A Prova na Investigação de Paternidade, 4ª, ed. Juruá, 1995, pg. 113”, no mesmo sentido, anotando o grau de confiabilidade da citada espécie de prova científica (DNA), observa que tal exame "é definitivo, porque não deixa qualquer margem de dúvida. Ele é a resposta positiva aos sonhos de Landsteiner, e às manifestações nesse sentido por autores como Afrânio Peixoto, Arnaldo Amado Ferreira, Barbier, Race, Brewer, Oswaldo Pataro Moreira e outros."
3.                                            E prossegue: "Esse exame pode ser efetuado determinando as seqüências de aminoácidos, em um par de alelos, (locus simples), ou em diversos pontos e regiões dos cromossomos,(locus múltiplo). No primeiro caso, é necessária a análise de diversos locus simples, para atingir a mesma potencialidade de dois loci múltiplos. Em qualquer dos casos, o resultado é a exclusão ou a confirmação da paternidade, com 100% de certeza. A única diferença, é que no primeiro caso - locus simples - o resultado é fornecido em probabilidade de paternidade, com freqüência acima de 99%; no segundo caso, o resultado afirma ou nega a paternidade", (grifamos).  Conclui o citado geneticista: "Freqüência acima de 99% (noventa e nove por cento), em se tratando de exame feito no DNA, é considerada universalmente como certeza científica!"
4.                                            Da mesma forma de que nos prelecionam os renomados doutrinadores suso citados, também nossos Tribunais, em várias decisões consignaram a importância da prova obtida pelo sistema DNA, cumprindo transcrever como ilustração as seguintes passagens:
A perícia do DNA (sistema de determinação de seqüência de aminoácidos codificados do DNA) e da tipagem HLA (antígenos leucocitários de histocompatibilidade), é reconhecida de confiabilidade absoluta na determinação da paternidade mesmo após a morte do suposto pai..." (Ap. Cív. nº 48.433, de Sombrio, rel. Des. Nilton Macedo Machado, DJE nº 9.244, de 30.05.95, pg. 09)
"A identificação digital genética do DNA constitui valiosíssimo recurso na distribuição da justiça, rápida e justa, possibilitando considerável economia de tempo e dinheiro." (Ap. Cív. nº 36.643, de Anchieta, rel. Des. Napoleão Amarante, DJE nº 8347, de 27.09.91, pg. 12)

III-                                          O DIREITO
1.                                            Deste modo, diante da certeza que dimana do exame científico pelo sistema DNA, reconhecida tanto na doutrina como na jurisprudência, emerge o direito do autor em vir ao Poder Judiciário para requerer a nulidade do ato do reconhecimento, valendo-se da ação negatória de paternidade e consequentemente a anulação do registro de nascimento. Frisa-se que o autor,  por força da aparente estabilidade do relacionamento que mantinha com a mãe biológica, supôs que o filho gerado por esta última era seu, e, nesta contingência, ainda diante das ameaças perpetradas, o registra em seu nome, e sendo assim, resta-lhe pugnar pela respectiva anulação do assento, tendo em vista a inequívoca prova que cientificamente demonstrou não ser ele o verdadeiro pai do rebento.

2.                                            O que houve, desenganadamente, foi uma declaração de vontade não correspondente ao verdadeiro ato volitivo do pai registral, pois agiu de modo contrário ao que certamente agiria se conhecesse, na época do registro, a verdade sobre a concepção. Ressalte-se, ainda, que o reconhecimento de filho nada mais é do que um ato jurídico stricto sensu, sendo certo que, partindo a respectiva declaração de uma verdade viciada, estaria ela sujeita a competente desconstituição por vício de consentimento, incidindo, no particular, a norma insculpida no art. 139, nº II do Código Civil, c/c com o artigo 185 do mesmo Código. Observa-se, ainda, que a matéria ora em exame encontra respaldo no Direito Comparado, pois tanto o Direito Positivo francês, (art. 399, 1ª parte), como o italiano, (art. 263, 1ª alínea), reconhecem a legitimação do pai registral para impugnar o respectivo reconhecimento, efetuado com base em vício de consentimento.
3.                                           Oportuno também mencionar que a genitora do suplicado não tinha a certeza da filiação arrogada ao autor, e tanto é verdade tal asseveração que espontaneamente sujeitou-se ao exame científico aludido, verificando-se o equívoco, presumindo-se sua anuência pelo ingresso da presente ação negatória de paternidade e conseqüente desconstituição do assento de registro.
4.                                            Consta do acórdão do 1º Tribunal de Justiça, apelação nº 90330-1, publicado in RT 656/76, que: tratando-se de reconhecimento de paternidade, não sendo os genitores casados, a presunção gerada pelo Registro Civil pode suportar oposição hábil e idônea, uma vez inexistente qualquer preceito de ordem pública impediente da declaração negatória da paternidade daquela que registrou, imputando-se essa condição. Assim, é possível a ação negatória de paternidade mesmo na ausência de qualquer das figuras do artigo 147,II, do código civil, pois importa a definição de que se queira dar ás circunstancias que levaram os interessados a fazer declaração que diz falsa. Admite tal ação todo gênero de provas e pode ser intentada por quem quer que nisso tenha interesse, a demais, pode ela prosperar sem que a barre o decurso do tempo, ou seja é ação imprescritível já que rege a espécie o disposto para as ações pessoais.  
5-                                            Cumpre, ainda aludir que o dispositivo legal mencionado na decisão supra se refere e tem o seu correlato no ao artigo 171, nº II, do Código Civil de 2002, aprovado pela lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, não havendo, data maxima venia, qualquer discrepância entre estes dispositivos legais no que tange a anulabilidade do ato jurídico.
6.                                            O Acórdão da 2ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça publicado in RT 674/113, nos esclarece de forma bem clara e objetiva sobre a possibilidade do ingresso da ação negatória de paternidade em casos de inobservância de algum dos defeitos dos atos jurídicos. Consta no corpo deste julgado, citando-se  inicialmente o festejado Caio Mário da Silva Pereira, que ”em contento o ato uma proclamação de paternidade que não corresponde à realidade, (o pai reconhece como seu o filho que não o é), o reconhecimento, embora formalmente perfeito, e até inspirado em pia causa, não pode produzir o efeito querido, e será anulado por falsidade ideológica”. Prossegue o julgado, alertando que ninguém pode ignorar os efeitos nefastos de uma paternidade não verdadeira para uma criança, assim para aquele que consta, no Registro, como pai. De nada adianta, para ambos, o vínculo jurídico incorretamente formado se a rejeição mútua, humanamente compreensível, sempre existirá. E o que dizer das demais conseqüências jurídicas da filiação, entre elas o dever de prestar alimentos e a sucessão?  O direito, assim, não poderia mesmo albergar, a pretexto de segurança jurídica, uma relação de tal ordem, pelo que a possibilidade de invalidação do ato viciado há de merecer todos os aplausos. A prova cabal e segura da negativa de paternidade já foi exercitada por consenso do autor e mãe do suplicado, merecendo o seu resultado plena confiabilidade.

IV-                                          REQUERIMENTOS
                                              Diante do exposto, requer o autor a Vossa Excelência que se digne de mandar citar o suplicado na pessoa de sua representante suso qualificada, para no prazo legal se pronunciar sobre os fatos ora descritos, podendo contestar e acompanhar todos os termos do processo até final, sob pena de revelia.  
                                       Protesta provar os fatos alegados por todos meios de provas em direito admitidas, especialmente prova pericial médica, oitiva de testemunhas, depoimento pessoal da representante legal do suplicado, e todas as outras que se fizeram necessárias, bem como a intervenção no feito do digno Representante do Ministério Público.

                                           Requer, ainda a Vossa Excelência que se digne de julgar procedente a presente ação, declarando a nulidade da paternidade do menor CARLOS JOSÉ DE SABREA, tido como filho do requerente, e que seja, em conseqüência, expedido mandado de averbação ao Cartório do Registro Civil da cidade de Jasmim-PR, para excluir da certidão de nascimento nº 45.276, fls.80-I, livro A-76, o nome do requerente. Requer, também, que se digne de desobrigar de pagamento de alimentos ao suplicado, tendo em vista não existir entre eles qualquer afinidade de parentesco.
                              Requer, finalmente, que se digne de conceder-lhe os benefícios da gratuidade da Justiça, isto porque não tem o suplicando condições de custear o processo e pagar honorários de advogado, consoante declaração anexada a presente.

                                          Nestes termos, dando à causa o valor de R$ 3.000,00, (três mil reais), para fins fiscais, condenando-se o suplicado em todas as cominações em face do princípio da sucumbência,
                                               p.deferimento.
                                               ___________ 13 de janeiro de 2012.

                                               Alberto de Camargo Taveira                                                                                                            
                                                             OAB/SP-28.870