Um motorista que
atropela e mata alguém enquanto dirige falando ao celular pratica homicídio
doloso, ou seja, com intenção. Essa, ao menos, foi a interpretação do Tribunal
Federal Regional (TRF) da 1.ª Região ao julgar recurso de um condutor condenado
em primeira instância no Pará. Ao recorrer, ele tentava reverter decisão do
juiz da 4.ª Vara Criminal da Seção Judiciária do Estado, buscando classificar o
crime como culposo, quando não há intenção de matar, com penas mais brandas.
Mas, para o
juiz-relator Fernando Tourinho Neto, do TRF, quem guia falando ao telefone
"demonstra o risco assumido de produzir o resultado" da morte da
vítima. Segundo argumentou em seu parecer, em ocorrências de trânsito há
"situações em que o dolo, ao menos eventual, se apresenta". Todos os
desembargadores da 3.ª Turma do TRF seguiram seu voto, proferido em outubro. Agora , o
processo deve seguir para apreciação do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O caso ocorreu em
uma noite de outubro de 2006 em uma estrada da cidade paraense de Ananindeua. O
Corsa dirigido pelo administrador Márcio Scaff atingiu e matou a policial
rodoviária federal Vanessa Siffert, que estava em serviço perto de um posto da
Polícia Rodoviária Federal.
De acordo com o
processo, Scaff alegou que obedecia ao limite de velocidade do trecho - 60 km/h . Além disso,
argumentou que "houve falha na sinalização da via, bem como negligência da
policial", que não usava um colete sinalizador.
No veículo, foi
encontrada uma porção de maconha. Apesar disso, o condutor se recusou a fazer
exame toxicológico após o atropelamento, o que também poderia atestar se ele
estava embriagado, o que ele nega.
Jurisprudência.
Maurício Januzzi, presidente da seccional paulista da Comissão de Trânsito da
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), explica que atualmente a jurisprudência
brasileira entende esse tipo de crime como homicídio culposo. "Se o STJ
mantiver essa decisão (do TRF), aí eu entenderei que será um avanço para o
País."
O processo revela
que Scaff admitiu estar falando ao telefone celular e teria se distraído por
causa disso. Contudo, o réu afirmou ter tentado desviar e evitar o
atropelamento. "Se vinha falando ao telefone, distraído como disse, como
poderia tentar desviar ou frear?", questionou Tourinho Neto em seu voto.
A pena para
homicídio culposo de trânsito é de 2
a 4 anos de prisão e para o doloso, de 6 a 20 anos.
Desvio de
atenção. Para Dirceu Rodrigues Alves Junior, chefe do Departamento de Medicina
de Tráfego Ocupacional da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego
(Abramet), dirigir falando ao celular já deveria constituir uma penalidade mais
severa do que é hoje: infração de trânsito média, que rende R$ 85,13 e quatro
pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH).
"Existem
três funções importantes para conduzir o veículo: a cognitiva, a motora e a
sensorial. Quando você tem o comprometimento de uma delas está impedido de
dirigir. E o celular faz isso."
Ele explica que
nem mesmo na função viva-voz ou com fones de ouvido o aparelho deve ser
utilizado por motoristas, pois ainda assim distrai o condutor, que acaba prestando
mais atenção à conversa.
Quando se está na
direção e o telefone toca, não deve ser atendido. É a dica do professor de
Engenharia de Tráfego Creso de Franco Peixoto, da Fundação Educacional
Inaciana. "Ligue depois. O número fica gravado."
CAIO DO VALLE
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